19.4.10

imersão

no final de dezembro passado me retirei para um lugar desconhecido e sem referências pra mim. não pensei muito antes de escolher o lugar, a única coisa que me importava era o desconhecido e a possibilidade de estar quieta e em silêncio. fui para uma ecovila que ficaria vazia todo o mês de janeiro, num lugar que não dizia nada sobre o meu passado, onde eu não conhecia ninguém e ninguém me conhecia.
pedi demissão do meu emprego, entreguei meu apartamento, coloquei na mala as minhas piores roupas, um caderno em branco e um lápis. nenhum adorno, nenhuma firula. fiz questão de deixar pra trás tudo o que podia me desviar de dentro de mim naquele momento. não pude me livar das lembranças. nem das boas e nem das que eu queria transformar em boas...
eu tinha um mês pra me reerguer, pra identificar e transformar o que não queria mais, o que não era eu. era um mês pra me reprogramar, pra reaprender a viver e a me relacionar comigo e com o mundo de dentro e de fora de mim. queria renascer. durante esse mês eu não faria julgamentos a respeito dos dias que viriam e não faria julgamento dos dias que tinham se passado a pouco. queria me observar.
estava muito ferida, destroçada. tinha sofrido uma perda grande e estava sem clareza nenhuma para entender o que tinha acontecido. estava imersa em profunda confusão e sofrimento. tinha perdido a ilusão da felicidade de viver uma vida que eu não queria mais pra mim, rodeada por pessoas que eu não conseguia me relacionar e com padrões, valores e questões que eu não sabia como lidar... experimentá-las à sorte da vida estava me causando um sofrimento quase mortal! então me retirei não para fugir, mas para enxergar o que encarar de frente. pra me desconstruir. pra me olhar. pra me indentificar. pra me curar.
foi um mês singular. a medida que os dias se passavam eu mergulhava numa viagem interna que me revelava aos poucos que eu tinha deixado muito mais coisa do que podia imaginar. nessa viagem vi meu ego se estribuchar diante dos meus olhos clamando por alguma coisa que pudesse lhe dar segurança e identidade. doeu fundo. doeu forte. não tinha a quem pedir colo e não tinha com quem chorar. eramos só eu e o universo inexplorado de dentro e de fora de mim... e eu mergulhava neles em dias e noites intermináveis.

e, de repente, me peguei tomada por uma sensação de estar nua e sem pele. não reconhecia o real e o irreal. não me reconhecia. não sabia mais nada a meu respeito.

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